terça-feira, 24 de junho de 2014

Pedagogia do Gado – Força de Trabalho


Nos últimos artigos temos seguido os rastros de uma entidade maligna e etérea que chamamos de Gênio do Mal, cujo objetivo é contaminar, bloquear e prender nossos corações para que percamos nossa humanidade e sejamos usados por ele como gado. Também temos visto que os propósitos do Gênio do Mal para nós enquanto gado-humano podem ser resumidos em três usos básicos:
  1. Alimento/Matéria-prima;
  2. Força de Trabalho; e
  3. Sacrifício
Já analisamos o que significa sermos usados como alimento e matéria-prima, e hoje discutiremos como e porque somos reduzidos a mera força de trabalho, ferramentas, objetos produtivos, escravos semi-humanos para o Gênio do Mal.
Entretanto, caso você ainda não tenha lido os textos anteriores, sugiro que faça isso agora, antes de prosseguir, pois estamos seguindo uma linha de raciocínio e utilizando uma série de analogias e parábolas que podem não ser bem compreendidas sem a base precedente. Para facilitar, disponibilizo os links das postagens imediatamente anteriores a esta:
Definitivamente, usar o gado-humano como força de trabalho é um dos objetivos mais óbvios e declarados do Gênio do Mal. Com certeza isso é claro para você, pois a maioria de nós temos sofrido, em maior ou menor grau, com o sentimento de escravidão advindo de nossas cargas horárias exageradas e exigências profissionais irracionais e desumanas. Porém, o que me deixa mais assombrado é notar que, apesar desse propósito ser o mais explícito e mais claramente sentido pela população em geral, também é o mais aceito e propagado por nós. Nossa identidade enquanto indivíduos parece estar profundamente enraizada em nossos conceitos de trabalho e produção. E, ao mesmo tempo que isso nos incomoda diariamente, nos conformamos e naturalizamos essa concepção. Com efeito, você realmente crê que é natural e necessário trabalhar oito horas por dia, seis dias por semana, onze meses por ano? Você realmente crê que quando seu expediente termina, o serviço fica no local de trabalho e você como indivíduo não continua sofrendo as consequências dele em casa? De fato, você consegue ter sua carreira como uma pequeníssima parcela de sua identidade, ou sua identidade é restrita meramente a sua profissão? Por que será que, quando falamos em “nossos direitos”, quase sempre isso se refere a direitos trabalhistas?
Abra os olhos um pouco mais e verá que a liberdade que nos é proposta é bem diferente do que imaginamos. Somos sim livres, mas também somos induzidos a usar nossa liberdade para escolher sermos escravizados de boa vontade. Somos escravos-livres. E o que tem nos escravizado não são nossos trabalhos/empregos, mas a cosmovisão moldada em nós. Somos “educados” a nos auto-escravizar.
Os antigos Hebreus possuíam uma lei que obrigava os donos de escravos a libertar seus serviçais no chamado “Ano do Jubileu”. Entretanto, caso o escravo gostasse muito de seu senhor e quisesse continuar em tal estado por considerar vantajoso de alguma forma, deveria realizar um ritual público no qual sua orelha seria furada para demonstrar que escolhia de livre e espontânea vontade continuar como escravo para sempre. Pois bem... A pseudo-educação tem sido utilizada para nos convencer a “furar nossas orelhas” para sermos escravos por livre escolha por toda a nossa vida.
Somos felizes bois de canga por toda a vida, até o dia em que nos aposentamos e morremos, tendo nossa carne comida pela depressão e pelo desânimo. E por que essa depressão vem? Porque nossa identidade foi tão intrinsecamente unida a nossa capacidade de trabalho que, ao nos aposentarmos, perdemos nossa única identidade, nosso senso de valor e nosso propósito de existência. Algumas poucas pessoas conseguem, pela necessidade, quebrar esse feitiço mental e utilizam seus anos de aposentadoria para cativar verdadeiramente seus corações que foram enterrados pelos anos de trabalho; outras até conseguem se distrair com atividades que as fazem esquecer do vazio de suas almas; mas a maioria simplesmente morre sem nunca ter sentido o que é ter valor simplesmente por quem é.
A pseudo-educação maligna tem sido extremamente eficaz ao nos convencer de que fomos criados para trabalhar, trabalhar, trabalhar e morrer quando não pudermos mais ser úteis.
Para constatarmos isso não são necessárias análises complexas, nem mesmo raciocínios profundos. Basta uma frase: “Você tem que estudar para ser 'alguém' na vida”. É desnecessário tentar convencer qualquer um que “ser 'alguém' na vida” significa ter um bom emprego e ganhar bem...

 
Toda a nossa lógica existencial gira ao redor do trabalho. A maioria de nós, simplesmente, vive para trabalhar e nada mais. E como uma parte funcional do corpo do Gênio do Mal (cf. último artigo), treinamos nossos filhos a fazer o mesmo.
Preste bastante atenção e analise se isso é real ou não nas desculpas que, geralmente, damos às crianças quando questionados sobre algum comportamento nosso ou sobre alguma exigência que colocamos sobre elas:
  • Mas o papai precisa trabalhar...”
  • Se eu não for, quem vai trazer comida pra dentro de casa?”
  • Eu trabalho pra te dar o que eu não tive!”
  • Do que você está reclamando? Eu me mato para não deixar faltar nada em casa!”
  • Eu trabalho o dia inteiro e não posso ter sossego quando chego em casa?”
  • Você tem que estudar para não ter que trabalhar tanto quanto o seu pai.”
  • O papai está muito cansado do trabalho... Outra hora a gente brinca.”
  • Se você não fizer faculdade, vai trabalhar com o quê?”
  • Você acha que vai ganhar dinheiro desenhando/pintando/cantando/dançando?”
  • Eu me matei trabalhando e você vai jogar isso fora desistindo da faculdade?”

O que todas essas frases têm em comum? Creio que já se tornou óbvio.
Poderíamos gastar páginas e mais páginas descrevendo todas as desculpas que damos dia a dia para nossos filhos para chegar à mesma conclusão. E essa conclusão é que, se tirarmos o trabalho de nossas vidas, não sobra muita coisa...
Pense nisso agora mesmo: se você não trabalhasse mais, o que seria da sua vida? E não me refiro somente aos “empregos”, mas ao trabalho como um todo – em casa, na vizinhança, na igreja, no clube, etc... Tirando todas as suas obrigações, tarefas e trabalhos, o que sobraria? O que te motivaria? O que você faria todos os dias? Sobre o que conversaria? E, talvez, a pergunta mais importante: QUEM SERIA VOCÊ? O que você pensaria sobre si mesmo? Que identidade você tem fora do emprego/trabalho? Quem você é além de ser vendedor, médico, pedreiro, secretária, professora, etc.?
O Gênio do Mal tem atacado nossa identidade, reduzindo ela a algo funcional, produtivo, trabalhista. Ele não quer saber quem somos, mas o que podemos fazer. Para ele não somos pessoas, mas números, estatísticas. Na realidade, ele tem medo de descobrirmos quem somos, nossa verdadeira identidade. Ele sabe que homens e mulheres com coração e identidade são perigosos. Por isso, seus esforços são para esmagar nossos corações e confundir, diluir e minimizar nossas identidades. E, sem perceber, fazemos exatamente o mesmo com nossas crianças...
Através dos pais, escola, sociedade, etc., a pseudo-educação, desde cedo, encuca em nossos filhos que o valor de alguém não reside em sua existência, em seu coração ou em sua humanidade, mas em sua produtividade e progresso funcional. Os educandos são forçados em um molde estreito no qual devem se organizar para progredir – isso não lembra algo em uma bandeira?
Nesse processo de objetivação do sujeito, um resultado insatisfatório em trabalhos, tarefas, projetos e provas é recebido com repreensões, acusações, rejeições e castigos que imprimem no coração infantil a mensagem: “Sejas produtivo ou não terás valor”. E, assim, nossos filhos estão sendo preparados, ou melhor, domados para serem uma boa força de trabalho. Afinal, “eles têm que aprender a lidar com isso porque, um dia, terão que enfrentar esse tipo de situação em um emprego”, não é verdade? Novamente, o trabalho é a desculpa para a dor emocional causada pela suposta educação...
A visão que recebemos e passamos adiante é essa:
Somos vistos como ferramentas: um prego sem ponta, um machado sem fio, uma serra sem dentes, um martelo flexível, uma chave torta ou uma régua fora de padrão não servem para nada. Assim somos vistos quando não alcançamos o padrão educacional estabelecido para a vida profissional: não servimos para nada.
Como se sente uma criança que percebe que seus gostos, seus dons, suas habilidades, suas tendências não são aplicáveis profissionalmente? Sentem-se incompetentes, burras, atrasadas, fora do padrão, uma falha, um erro, esquisitas, estranhas, relegadas a um canto escuro, destinadas a serem pobres e marginalizadas, rejeitadas por não terem o que é preciso para serem “um sucesso”.
E não posso deixar de dizer que isso não é culpa exclusiva do pensamento capitalista, como muitos de nós fomos treinados a pensar e vários de vocês já devem ter pensado até aqui. Como uma das prerrogativas do capitalismo é o acúmulo de bens através da produção, e esta produção ocorre fundamentalmente pelo uso da força de trabalho, não há como negar a ligação com o que viemos discutindo até o momento. Todavia, os marxistas que me desculpem, mas Karl Marx é responsável pelo alastramento desse pensamento mais do que qualquer capitalista. Sei que estou entrando numa baita briga ao falar isso, mas é o que posso averiguar ao analisar o seu materialismo histórico dialético – principal vertente filosófica que influencia a educação escolar, em especial, no Brasil. Não me entendam mal: reconheço as contribuições de Marx para várias discussões, entretanto, sua visão da realidade baseada principalmente no que é material e, em especial, sua divisão da história a partir dos meios de produção demonstram explicitamente sua concepção de que a humanidade está diretamente ligada a sua capacidade de trabalho e produção. Caso eu esteja louco ao analisar Marx dessa forma, alguém me corrija, mas creio não estar equivocado.
Passei quatro anos “estudando para ser pedagogo”, e o que mais apresentaram a mim foram as concepções de Marx. Minha formação acadêmica teve Marx do início ao fim. Dessa forma, a menos que todos os meus professores tenham ensinado algo totalmente diferente da realidade, o marxismo encucado na maioria esmagadora dos educadores brasileiros dá conta de que o ser humano é uma força social, histórica e de trabalho. O próprio pensamento comunista, que se diz tão diferente do capitalista, não tem nada de diferente quanto ao valor do ser humano como força de trabalho. A diferença é que, no modelo comunista, o indivíduo não trabalha mais para si só, mas, teoricamente, para a sociedade como um todo. Mais uma vez, me desculpem os marxistas, mas essa ideia me parece diminuir ainda mais o valor do indivíduo como tal, uma vez que ele é visto como uma “engrenagem” que serve para a máquina social funcionar.
Enfim... não estou aqui para debater sobre concepções filosóficas específicas, mas para denunciar os desígnios malignos da Gênio do Mal. E, neste sentido, tanto o marxismo quanto o capitalismo – ou qualquer outra concepção que determine o valor humano baseado em seu potencial de trabalho – são ferramentas do Gênio do Mal para nos escravizar de bom grado.
Também não estou aqui defendendo um ócio generalizado em que ninguém mais trabalhe, ou que não se apresentem elementos profissionais durante o processo educativo. O trabalho é sim importante, mas não por si só. O trabalho deve ser uma extensão natural das atividade de um sujeito que tem sua identidade bem formada e age baseado no valor que dá a si mesmo, seus interesses, habilidades, valores, etc.
Neste sentido, não devemos educar para o trabalho, mas devemos educar para a vida; não devemos desejar o progresso da criança em competências meramente profissionais, mas devemos almejar o desenvolvimento integral da criança, sempre valorizando o autoconhecimento e a busca pela identidade pessoal; não devemos formar um profissional, mas cultivar um coração.

Mas, antes de terminar, tenho que alertar mais uma vez: você não pode dar o que não tem. Então, antes de pensar em como ajudar seu filho a não ser gado para força de trabalho, balance a cabeça e derrube a canga do seu próprio pescoço. Reavalie sua vida pessoal, profissional, acadêmica... Será que precisa ser assim? Sua vida não poderia ser diferente? É impossível mudar sua visão de trabalho? Você trabalha como precisa, como gostaria ou como o Gênio do Mal quer? Enfim, você já furou sua orelha?




PARA AMPLIAR SUA VISÃO E NOSSAS DISCUSSÕES, SUGIRO QUE ASSISTA AO VÍDEO “EDUCAÇÃO PROIBIDA”, QUE DEIXO ABAIXO:





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