sexta-feira, 6 de abril de 2012

Os Pais podem ser Professores? (Parte 1)

Recentemente, foi-me sugerido escrever algum texto abordando a questão dos pais enquanto professores de seus filhos. Afinal, os responsáveis pelas crianças realmente podem se considerar aptos para ensinar seus pupilos? É possível pais e mães sem formação superior instruir de forma adequada suas crianças?
Bem... vamos discutir sobre isso...
E, para começar, farei algo que já fiz antes: iniciarei apresentando um texto de minha amiga Leica Wada sobre o assunto (retirado de sua pesquisa realizada em 2010 e publicada em 2011) e, posteriormente, tecerei alguns comentários pessoais sobre o assunto.
Dessa forma, lhes deixo com o brilhante trabalho de Wada:


A falta de formação dos pais para educar seus filhos em casa é um item constantemente questionado por críticos da educação domiciliar. Esses críticos acreditam que, sem uma formação acadêmica específica para lecionar, os pais sejam incapazes de fornecer instrução aos seus próprios filhos no lar.
Contudo, esse argumento também parece desconsiderar o processo histórico pelo qual a sociedade passou até chegar aos nossos dias. Afinal, os seres humanos vêm compartilhando informações e habilidades, e transmitindo-as aos seus filhos desde seus primórdios. Durante todo esse tempo, houve muito poucos professoresno sentido de pessoas cujo único trabalho seja ensinar aos outros o que sabiam. Na realidade, até muito recentemente (em termos históricos) não havia pessoas cuja vida profissional fosse dedicada exclusivamente ao ensino de outros.
Alguns autores tecem uma análise bastante interessante sobre a formação acadêmica dos professores. Em geral, a humanidade sempre entendeu, logicamente, que para alguém ensinar algo, era preciso saber sobre o que seria ensinado. No entanto, muito recentemente o ser humano obteve a extraordinária ideia de que, para ser capaz de ensinar o que se sabe é necessário passar anos sendo ensinados a ensinar(HOLT, 2003, p. 41. Tradução nossa).
Na prática, educadores que se preocupam com pessoassem qualificaçãoensinando seus próprios filhos quase sempre definemqualificaçãoquerendo dizer professores formados em faculdades de pedagogia e que possuem diplomas de professores. Eles pressupõem que ensinar as crianças envolve uma série de competências misteriosas que podem ser aprendidas em faculdades de pedagogia, e que são de fato ensinadas lá; que as pessoas que têm essa formação ensinam muito melhor do que aquelas que não têm; e que de fato as pessoas que não tiveram essa formação não são competentes para ensinar de formaalguma (HOLT, 2003, p. 40. Tradução nossa).
Celeti (2011, p. 81), em sua dissertação de mestradoEducação Não Obrigatória: Uma Discussão Sobre o Estado e o Mercado, afirma:
Certamente que nem todos os pais possuem formação adequada para educar seus filhos, porém não implica dizer que nenhum seja capaz de exercer a função. Além disto, existem diversos grupos de pais e instituições, bem como material didático e instrutivo, que podem ajudar aos pais se tornarem professores. Se o processo de ensino-aprendizagem não é uma mera transmissão de conhecimentos, mas uma dialética entre professor-aluno, então os pais são os verdadeiros professores que ensinam aprendendo. O homeschooling também é um espaço no qual ― “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender (FREIRE apud CELETI, 2011, p.81).
A maioria das autoridades escolares afirma publicamente que professores precisam de qualificações especiais para se tornar competentes. Como resultado, as organizações de ensino, muitas vezes, promovem uma regulamentação ou interpretação da lei exigindo que pais que educam seus próprios filhos em casa possuam uma dessas três qualificações: 1) diploma de professor, 2) diploma universitário, ou 3) aprovação em exames para professor. Embora pareçam lógicos superficialmente, esses requisitos não violam o direito dos pais de ensinar seus filhos conforme garantido por lei (nos EUA, pelo menos), mas criam a ilusão de que certificação acadêmica é equivalente à qualidade do ensino das crianças. Contudo, praticamente todas as pesquisas realizadas sobre o assunto apontam que não existe uma correlação positiva entre a qualificação dos professores e o desempenho dos alunos (KLICKA, 2011).
Não é mistério o fato de que ensinar envolve e requer algumas habilidades práticasentretanto, é um grande equívoco afirmar que tais habilidades somente podem ser adquiridas através da conclusão de um curso superior. Segundo Holt (2003), as habilidades para ensinar estão entre as muitas coisas do senso comum que aprendemos com a vida. Com relação a estas habilidades para ensinar, o autor afirma que, por muito tempo, as pessoas que apresentavam facilidade para compartilhar o que sabiam perceberam certas coisas:
[...] (1) para ajudar as pessoas a aprender algo, deve-se primeiro entender o que elas sabem; (2) mostrar às pessoas como fazer algo é melhor do que lhes dizer o que fazer, e deixá-las fazer sozinhas é melhor ainda; (3) não se deve dizer ou mostrar muita coisa de uma vez, que as pessoas digerem novas ideias lentamente e devem se sentir seguras com novas habilidades ou conhecimentos antes de estarem prontas para mais; (4) deve-se dar às pessoas o tempo que elas quiserem e precisarem para absorver o que foi mostrado ou dito à elas; (5) ao invés de testar seus conhecimentos com perguntas, deve-se deixá-las mostrar o quanto ou quão pouco elas entenderam por meio de perguntas feitas à elas; (6) não se deve ficar impaciente ou irritado quando as pessoas não entenderem; (7) assustar as pessoas apenas bloqueia a aprendizagem, e assim por diante. Claramente, não são coisas que requerem três anos para aprender (HOLT, 2003, p. 41. Tradução nossa).
O autor também faz uma crítica aos cursos de graduação relacionados ao ensino, afirmando que muito do que se ensina nessas faculdades não possui relação com o ato de ensinar em si, mas com ideias sobre como trabalhar no universo escolarou seja, como falar a língua das escolas, como cumprir suas burocracias e como julgar os alunos. Nessas instituições, osalunos são ensinados a pensar que aquilo o que sabem é extremamente importante e que são os únicos que possuem esse conhecimento(HOLT, 2003, p. 42. Tradução nossa).
A ideia de que professores graduados ensinam melhor do que aqueles que não possuem qualquer certificação, ou que pessoas sem qualificação não são capazes de ensinar, não possui bases sólidas, nem evidências que a sustente. Com efeito, muitos estudos vêm provando justamente o contrário.
Um dos estudos mais importantes nesta área foi realizado pelo Dr. Eric Hanushek, da Universidade de Rochester, que analisou os resultados de 113 estudos sobre o impacto dos títulos dos professores sobre o rendimento escolar de seus alunos. Oitenta e cinco por cento dos estudos não encontraram correlação positiva entre o desempenho escolar dos alunos e a formação educacional do professor. Apesar de sete por cento dos estudos encontrarem uma correlação positiva, cinco por cento encontraram um impacto negativo.
Aqueles que exigem a qualificação acadêmica para pais que educam seus filhos em casa não possuem dados concretos ou argumentos suficientemente consistentes para apoiar a necessidade de tais normas. Os resultados desses 113 estudos analisados por Hanushek são, certamente, uma denúncia contra os defensores de determinados padrões de ensino para pais que educam seus filhos em casa (KLICKA, 2011).
Diversos outros pesquisadores também realizaram estudos para tentar encontrar uma correlação positiva entre a certificação do professor e o desempenho dos alunos (FREEMAN; FLODAN; HOWSAN; CORRIGAN apud KLICKA, 2011). Entretanto, essas pesquisas também comprovaram que não existe correlação significativa entre a certificação do professor e a aprendizagem dos alunos, e que avaliar o aluno é um excelente método para determinar a eficiência do professor.
Health e Nielson (apud KLICKA, 2011) analisaram 42 estudos sobre a qualidade do ensino dos professores e sua relação com a formação dos mesmos, e concluíram que não existe evidência empírica para estabelecer uma relação positiva entre a formação dos professores e o rendimento dos alunos. De acordo com esses autores, todos os estudos demonstram que a experiência prática dos pais que educam seus próprios filhos em casa é muito mais eficiente do que gastar o mesmo período de tempo na obtenção de um bacharelado em educação.
Em suma, os resultados de todos os estudos não sustentam a ideia de que os pais precisam ser professores formados e certificados para garantir um rendimento acadêmico bem-sucedido para seus filhos. Logo, o status de certificação do pai-educador não possui influência significativa no desempenho do filho-educando (KLICKA, 2011).
No geral, o rendimento das crianças educadas em casa está acima da média nacional em testes de rendimento padrão. As mesmas pesquisas que apontam esses dados têm demonstrado que apenas 35% das mães que ensinam seus filhos em casa possuem diploma universitário ou de ensino superior, e ainda assim, seus filhos não pontuaram mais nos testes do que aqueles que estão sendo ensinados por mães sem diploma universitário (RAY apud KLICKA, 2011).
Com relação à legislação nos Estados Unidos sobre a formação dos pais como educadores, os pais serão considerados competentes para educar no lar se seguirem os regulamentos de cada estado. Embora todos os estados permitam a educação domiciliar, diferentes níveis de conformidade, dependendo de onde a pessoa mora. De acordocom o resumo das leis da educação domiciliar publicado no site do HDSLA1 (Homeschooling Legal Defense Association), 41 estados não exigem que os pais possuam formação específica como professores. Nove estados exigem apenas o Diploma de Ensino Médio ou Diploma de Educação Geral (GED): Geórgia, Carolina do Norte, Dakota do Norte, Novo México, Ohio, Pensilvânia, Carolina do Sul, Tennessee e Virgínia Ocidental. O Distrito de Columbia também exige que o pai-educador possua Diploma de Ensino Médio ou Diploma de Educação Geral. Em TN, não exigência de formação de professor do pai-educador para as séries do Jardim ao Ensino Fundamental, desde que o aluno esteja matriculado em uma escola particular ou paroquial. Dakota do Norte não exige Diploma de Ensino Médio ou Diploma de Educação Geral, contanto que o pai seja monitorado por um professor certificado por dois anos. Três estadosCalifórnia, Kansas, e Nova Yorkexigem que os pais-educadores sejam competentes, qualificados, ou capazes de ensinar. Nesses estados, o pai-educador pode ser reconhecido como competente ou capaz de ensinar sem possuir o Diploma de Ensino Médio ou Diploma de Educação Geral. Em Nova York, os pais que cumprirem a regulamentação da educação domiciliar são considerados competentes.
Em geral, muitos tribunais norte-americanos têm entendido que os requisitos exigidos dos pais-educadores no tocante à formação superior são excessivos ou inadequados. A tendência das leis estaduais em todo o país indica um abandono dos requisitos dessas qualificações para lecionar na educação domiciliar. Na realidade, os americanos, em geral, estão percebendo que a necessidade de diplomas de professor para que os pais ensinem seus filhos em casa é um mito. Apenas sindicatos de professores e outros membros de estabelecimentos escolares formam a pequena minoria que continua pressionando para que haja certificação para que os pais possam ensinar em casao que, aparentemente, não se constitui como uma defesa da qualidade da educação, mas uma proteção do monopólio educacional (KLICKA, 2011).
Como é possível observar, não um problema real na possibilidade de pais ensinarem seus próprios filhos, mesmo não havendo uma formação superior. Afinal, ensinar não depende, necessariamente, de um diploma, mas da existência de habilidades pessoais básicas para se transmitir o conhecimento.
Sobre as verdadeiras habilidades necessárias para se ensinar um sujeito, Peavey (apud KLICKA, 2011) explica que encontrou uma forma válida para identificar um bom professor:
[...] foi descoberta uma forma válida, legal, honesta, profissional e lógica para se identificar um bom professor [...]. Trata-se de um processo simples. O primeiro passo é parar de olhar para os professores e começar a olhar para os alunos. O segundo passo é determinar o quão bem os alunos estão aprendendo o que devem aprender. A qualidade da aprendizagem proporciona a única medida válida da qualidade do ensino descoberta (PEAVEY apud KLICKA, 2011, s. p. Tradução nossa.)
Para concluir, ainda citamos que, mesmo no caso de pais que não apresentem todas as habilidades necessárias para instruir seus próprios filhos, a possibilidade de suprir tais necessidades através do apoio de terceiros. Nos EUA, o apoio à educação domiciliar pode vir de várias formas, incluindo a obtenção de informações das associações estaduais ou nacionais, envolvendo-se em um grupo da comunidade local e obtenção de certificação de professor2. ao pensar na realidade brasileira, vale apontar as sugestões apresentadas por Schebella (2007):
[...] um curso mínimo para que os pais possam instruir seus filhos [...]. Entretanto, essa capacitação deveria ser bem direcionada, com uma fundamentação pedagógica consistente e rica, tanto teórica quanto praticamente [...] Uma [...] opção se apresenta mais realista e com uma potencialidade maior para sua efetivação: seguindo a proposta de instituições reguladoras para a educação domiciliar, estas poderiam (ou deveriam) disponibilizar de pessoal especializado, com formação pedagógica direcionada para a capacitação e auxílio dos pais que optem por educar seus filhos no lar. Dessa forma, os pais poderiam receber um direcionamento adequado para suas práticas mediante o aconselhamento de pedagogos formados, sem custos adicionaisdesde que a instituição em questão seja, como proposto, sem fins lucrativos (2007, p. 54-55).
De qualquer forma, é visível que, de acordo com os estudos realizados, assim como o mito da socialização, o mito da incapacidade dos pais em instruir seus filhos por falta de formação superior não se sustenta, nem apresenta qualquer empecilho real para a aplicação da modalidade domiciliar de educação.
1 Fonte: HSDLA. Summary of Laws. Disponível em: <http://www.hslda.org/laws/Summary_of_Laws.pdf> Acesso em: 20/04/2011 às 13:00.
2 Fonte: eHow Family. Homeschool Teacher Certification. Disponível em: <http://www.ehow.com/facts_5944079_homeschool-teacher-certification.html> Acesso em: 20/04/2011 às 12:00.

2 comentários:

  1. Diploma é diferente de competência.
    Competência associa-se a amor, vínculo...
    Os pais possuem as três características para educarem integralmente seus filhos!
    Os pais serão sempre os mais interessados em ver seus filhos realizados e equilibrados em todas as áreas da vida.

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  2. Jesus não vai pedir nenhum diploma...
    Mas vai pedir sim, o coração do seu filho (a)!
    Educação em casa é mesmo a melhor opção para filhos santos e equilibrados!

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